Amêndoas ou Páscoa?

Amêndoas ou Páscoa?

Mais uma vez, desde há séculos, iremos celebrar a Páscoa cristã. Este ano, o Papa sugeriu que o jejum quaresmal fosse uma ausência de vícios e hábitos prejudicais, sublinhando que a guerra é o pior pecado da humanidade.

Sofrem sempre os mesmos: os pobres, os mais novos, os doentes e os que não têm ligações poderosas que lhes possam valer. O prolongar dos conflitos, para além dos milhares de mortos, causa uma enorme onda de migrações, nem sempre com bom sucesso. Os refugiados sentem-se, inicialmente felizes, pois conseguiram fugir da morte certa, mas rapidamente começam a perceber que o seu futuro continua muito incerto: ninguém os quer, todos os afugentam ou ignoram, na esperança de que continuem a migrar para outros países e passem a ser “problema dos outros”.

Os partidos vão assumindo papéis muito pardos, no sentido em que vocalizam o que sentem ser os sentimentos da populaça… outros reagem no sentido de apoiar os migrantes e refugiados. Mas poucos os querem perto de casa: que se instalem em “campos”, de preferência longe de minha casa…

Há poucos anos foi proposto aos alunos em Portugal que imaginassem ter de fugir rapidamente e levar apenas uma simples mochila nessa fuga. Que levariam na mochila? Foi um exercício interessante e muito esclarecedor. Os nossos alunos conseguiram imaginar o que sentem os refugiados e alguns choraram de tristeza, desespero e revolta.

Seria interessante pensar no que levaria na minha mochila numa situação dessas e o que esperaria dos outros onde procurasse refúgio. Ser escorraçado, seria o mais certo – pois é o que se passa em todo o lado -, ser ignorado, chorar pela família e estar sempre alerta contra tantas ameaças: a fome, a doença, a morte, a perseguição de povos europeus muito civilizados. O perder o contacto com os familiares (daí que todos trazem telemóveis) será a maior das dores.

Nós, que muitas vezes olhamos de lado estes povos escorraçados, poderíamos fazer um exercício: olhar no espelho e imaginarmo-nos rotos, sujos, cabelos emaranhados, pés descalços ou com alpercatas rotas e sujas, com um olhar vazio à procura de esperança, a imaginar onde estarão os nossos filhos e familiares… As amêndoas pascais seriam bem mais amargas e a nossa garganta apertar-se-ia com uma dor imaginária.

Por isso, proponho que nesta Páscoa, com tanta dor no mundo, no domingo de Páscoa deixemos a doçura das amêndoas e o envelope com dinheiro para o padre e procurássemos uma forma de ajudar os refugiados. Visitai o site da ACNUR Portugal, ( https://pacnur.org/ ) e vejam e sintam o que eles partilham conosco e o modo de ajudar. Deixemo-nos marcar por esta realidade tão dolorosa.

Não procuremos o chocolate doce e suave do comércio, mas pensemos muito na coroa de espinhos do Cristo na cruz e com Ele encaremos os nossos refugiados! Essa poderá ser a nossa Páscoa: a passagem do conforto do sofá para a ação, por muito simples que seja.

Boa Páscoa para todos, são os votos da Direção do Agrupamento de Escolas da Murtosa.

Manuel Arcêncio

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